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novembro 08, 2014

Sintonia perdida.

Quando Marcos confirmou aquele reencontro passou a contar as horas até que chegasse o momento de rever o amigo de infância e adolescência. Sua amizade com Maurício foi um daqueles encontros que não acontecem muitas vezes na vida. Algo especial para se guardar no "lado esquerdo do peito".
 Os dois se conheceram nos primeiros anos do curso fundamental e permaneceram na mesma escola e, quase sempre, na mesma classe até o segundo ano do ensino médio, quando o pai de Maurício, que era funcionário do Banco do Brasil,foi transferido de cidade.
Eles se separaram com promessas de que se veriam sempre e que a amizade nunca acabaria. Nos primeiros anos, eles se comunicaram através de cartas, algumas poucas vezes falaram por telefone e, com a passagem do tempo, as cartas e os telefonemas foram se espaçando até que deixaram de existir.
Marcos e Maurício ficaram alguns anos sem se falarem. Um não sabia do outro. Marcos tentou contato com o amigo, mas foi em vão. Suas cartas voltaram e o número de telefone mudou de dono. O jeito foi esquecer o amigo e seguir a sua vida. 
Novas amizades surgiram, a vida seguiu o seu curso. Mas aquela amizade, aquela sintonia que existia entre ele e Maurício nunca mais aconteceu. Por isso, Marcos queria tanto reencontrar o amigo. Em sua imaginação, a amizade continuava intacta, o tempo não tinha feito nenhuma diferença. Bastaria que eles se encontrassem para que tudo voltasse a ser como antes.
E foi com esse pensamento que Marcos caminhou para aquele encontro que só estava sendo possível pelo milagre da internet. Foi através do Facebook que os dois voltaram a se encontrar. Marcos viu a foto do amigo e não teve dúvida, era ele. Sem demora, mandou um pedido de amizade e, para sua sorte, Maurício aceitou imediatamente.
Desde então, os dois mantêm contato. Marcos, sempre muito falante e cheio de saudades, e Maurício, bastante reservado, com respostas monossilábicas às muitas indagações do amigo de infância e adolescência.
A caminho do encontro, marcado num bar na orla de Copacabana, Marcos vai fazendo planos. Não vê a hora de dar um forte abraço no amigo e matar a saudade. Ele chega ao bar e avista um homem gordo sentado numa mesa a um canto, acompanhado por duas mulheres. O homem levanta e vem ao seu encontro. Ele não tem dúvida, é Maurício. Quanta diferença! Ele era tão magro e agora...
- O tempo passou, Marquinho. - grita Maurício, diante da surpresa do amigo.
E ali, de pé, eles trocam as primeiras impressões. Marcos pensa dizer que a foto no Facebook não denotava tanta diferença, mas prefere ficar calado. O amigo apressa em apresentar as duas amigas que estão na mesa. São suas convidadas. Ele as conheceu na praia e as convidou para animar o encontro dos dois:
- Não me leve a mal, mas eu não sou de ficar de encontrinho com homem. Meu negócio é mulher. E espero que você também goste da fruta. Ou eu tô enganado?
Marcos não consegue esconder o constrangimento.  Diante do silêncio que se estabelece, Maurício continua:
- No nosso tempo  de criança você costumava desmunhecar um pouco...
Maurício solta uma sonora gargalhada e é acompanhado pelas duas mulheres. Marcos tem vontade de sair correndo do bar. A decepção é muito grande. Ele foi até ali ao encontro de um amigo que não via há muitos anos e não de um bêbado desagradável.
Novo silêncio. Marcos tem que decidir: ele vai para a mesa com o amigo bêbado e as duas mulheres ou volta para a rua e esquece aquele reencontro infeliz? Ele decide tomar o caminho da rua.
Lá fora, um sol de fim de tarde não desmente a estação. É horário de verão e o calor está forte. Marcos caminha um pouco. Está desnorteado. Aquele homem no bar não era seu amigo de infância e adolescência, era apenas um estranho. O Maurício, amigo inesquecível, ficou lá atrás na bruma do tempo protegido pela memória e lá que ele deve permanecer.

Bom domingo.